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Consciência Moral e Liberdade Humana - Parte 1


 
A consciência

A consciência psicológica é o poder que possui o espírito de perceber a si mesmo. É a intuição que um ser tem das modificações que nele se processam, a função pela qual conhecemos nossa vida interior.

A consciência pode ser considerada sob quatro aspectos: conteúdo (objeto à consciência); atividade (função psíquica unificadora da vida mental); violência (experiência vital, estado vivido das consciências); saber (conhecimento das coisas vividas ou aprendidas).

A intencionalidade, isto é, o ato de tender a algo distinto de si mesmo, é o caráter de toda consciência atual. A consciência só existe, portanto, como consciência, algo distinto de si mesma, a consciência revela a objeto, revela a si mesma.

Consciência psíquica

Sob ponto de vista psicológico, a consciência caracteriza-se por uma atividade de síntese mental, que consiste em coordenar, num ato único de pensamento, um número, maior ou menor, de elementos psíquicos. O tipo dessa atividade sintética é representado pela atenção, que se manifesta pela unificação da vida psíquica nem sentido determinado, acompanhada de um grau elevado de consciência.

A síntese mental pode ainda ser encontrada na percepção (consciência simultânea da direção geral do pensamento e da ligação lógica entre as proposições sucessivas). Todos os fenômenos psíquicos que não se encontram integrados nessa síntese mental, isto é, que se acham à margem do curso do pensamento principal, escapam à consciência. São elementos psíquicos que ficam isolados e ignorados do pensamento claro.

Os atos que correspondem a esses elementos constituem as distrações; eles são inconscientes nesse momento, mas podem revelar-se à consciência por suas conseqüências. A intensidade da impressão não é como parece, o fator necessário e suficiente da consciência. Realmente, o fator intensidade é muito relativo. Tal fato exterior, que sobre um indivíduo produz impressão considerável, mal é percebido por outro, colocado, entretanto, nas mesmas condições externas, mas absorto em profunda reflexão. De outro ponto de vista, s intensidade é sempre mais ou menos relativa, pois depende dos interesses do momento.

Depende também do hábito. Formas de consciência Consciência espontânea: é o conhecimento imediato que acompanha todos os fenômenos psicológicos. Poderia ser, por isso, melhor denominada consciência direta ou imediata, porque é a primeira impressão de nossos estados psíquicos. “Se não fosse essa consciência, todos esses estados nos iam ser estranhos, exatamente como os fenômenos da vida vegetativa.

” A consciência espontânea é confusa e indistinta: é uma espécie de sentimento global da vida psicológica, pela qual esta nos é dada, sobretudo pela continuidade em seu fluir. Consciência refletida: é a volta deliberada do espírito sobre si mesmo, os fatos surgem bruscamente e se impõe ao nosso espírito. Na consciência refletida, nascem de uma elaboração, de uma reflexão mais ou menos prolongada.

Podemos dizer que consciência refletida é a consciência de si mesma. Foulquié prefere distinguir, de um lado, a consciência imediata ou não-posicional, isto é, que não situa, não afirma nada, nem objeto, nem sujeito; de outro lado, a tomada de consciência ou consciência posicional, que situa ou afirma alguma coisa. Esta tomada de consciência é diretamente consciência do objeto. Nos seres capazes de reflexão, como o homem, ela se torna consciência de si mesma.

Graus da consciência

A consciência apresenta, vários graus de ou níveis de intensidade, clareza e concentração. Costuma-se destacar nela três zonas principais: a) a consciência propriamente dita que é a zona mais clara e intensa, chamada foco da consciência; b) o subconsciente, que é a zona parcialmente iluminada, marginal ou crepuscular da consciência; c) o inconsciente, que é a zona escura ou noturna da vida psíquica.

Essas zonas não estão separadas, pelo contrário, acham-se unidas e em contínua integração. Todas dependem uma das outras. E a atividade sintética da consciência na sua função de adaptação ao real só consegue êxito graças à colaboração do subconsciente e do inconsciente. Entre essas zonas de maior ou menor intensidade da vida psíquica existem graus intermediários de consciência. A maioria admite a divisão clássica: consciência, subconsciente e inconsciente. Já os psicanalistas estabelecem outra divisão. Para Freud. A vida psíquica compreende três zonas: a do Ego, a do Superego e a do Id. O Ego compõe-se de elementos conscientes e pré-conscientes.

O Superego é constituído pelo inconsciente recalcante; O Id., pelo inconsciente recalcado. Jung assinala na vida psíquica a consciência, o pré-consciente e o inconsciente. Mas divide este em inconsciente pessoal e inconsciente coletivo. Luís Juan Guerreio, a vida psíquica abrange três zonas: a) a zona propriamente consciente, onde se distinguem o foco da consciência e o campo marginal da consciência; b) a zona intermediária do umbral da consciência, que representa a consciência diminuída ou liminiar; c) a zona infraconsciente, que compreende a subconsciência ou consciência virtual, e a inconsciência ou consciência dissociada.

Na realidade, a consciência é uma só com graus diversos de intensidade, clareza e concentração. É uma concepção espacial que não reflete, com fidelidade, a natureza unitária, global e dinâmica da vida psíquica.Essas zonas assinaladas pelos psicólogos só podem ser admitidas como hipóteses de trabalho para exprimir os diversos níveis da vida psíquica, em que a consciência se torna, cada vez menos clara, vivia e concentrada, à medida que os fenômenos psíquicos estão menos ligados às imagens pessoais do eu.

Na mesma medida em que se desligam das imagens pessoais do eu., os fatos psíquicos tendem a transformar-se em puras virtualidades atualizam-se em razão e em proporção de sua relação com as imagens e os interesses pessoais do eu.Caracteres da consciência. A consciência possui os seguintes caracteres fundamentais: Dinamismo: os fatos de consciência se sucedem e se transformam, sem interrupção. Tonalidade: os fatos da consciência formam conjuntos unitários e coerentes.

Estes conjuntos constituem diversos planos ou níveis de unificação. Os fatos da consciência forma estruturas complexas, inter-relacionadas, comparáveis a estratos superpostos, os processos de maior concentração mental determinam uma maior unidade consciente, enquanto que os processos psíquicos de menor tensão e maior dispersão se produzem num nível ou estrato inferior da consciência.
Imediatismo: os fatos da consciência, em razão de serem a experiência que o sujeito tem de si mesmo, não admitem intermediário.

Subjetividade: os fatos da consciência possuem sempre relação com um eu, são portanto, pessoais ao sujeito e, como tais, incomunicáveis e invioláveis. Esses fatos são incomunicáveis, invioláveis. É um mundo fechado.
Intencionalidade: os fatos da consciência se referem sempre a algum objeto, isto é, tendem para alguma coisa. Daí o axioma fundamentalmente da femenologia: a consciência é sempre a consciência de alguma coisa e não dela mesma ou de seus estados.

Prospecção: os fatos da consciência integram-se no comportamento do homem permanente é a adaptação ao meio e à realidade.Patologia da consciência. A consciência pode sofrer, em determinados casos, as seguintes alterações patológicas:

Obnubilação: debilitação psíquica da convivência com diminuição se sua clareza e enfraquecimento da atividade intelectual. Nas intoxicações, nas infecções, nos estados demências, etc.

Estado crepuscular: forma transitória de obnubilação, com alterações da percepção do mundo exterior. Observa-se na histeria, na epilepsia, nas psicoses tóxicas, etc.

Onirismo: No sonho normal ou nos estados oníricos de certas psicoses, a consciência perde a tensão psíquica, dissocia-se, desintegra-se, torna-se incapaz de assegurar a síntese mental e é denominada pelas pulsões do inconsciente e do intestino.

Coma: estado de sonolência e de torpor profundo acompanhado de suspensão, mais ou menos completa, da atividade psíquica, com perturbações da mortalidade e da sensibilidade.Função da consciência. A consciência constitui o instrumento de percepção do espírito pelo próprio espírito, órgão de adaptação da vida psíquica à realidade.

Para o exército dessa dupla função, a consciência: a) por meio da atenção, escolhe, seleciona os fatos do mundo exterior ou interior; b) por meio da associação, reúnem os fatos em sínteses ou estruturas articuladas; c) por meio de hábito, assimila, isto é, integra no próprio seio os fatos escolhidos e associados; d) por meio do eu e da síntese e à ação. A consciência representa assim, o foco de convergência e de irradiação de toda a vida psicológica.

A Consciência Moral e a Liberdade Humana

A consciência de si mesmo ou auto consciência confere ao ser humano a capacidade de julgar ações, e de escolher, dentre as circunstâncias possíveis, sue próprio caminho na vida.

A essa característica peculiar ao homem, de julgar suas próprias ações, decidindo se elas são boas ou más, damos o nome de consciência moral.

A possibilidade que o homem tem de escolher seu caminho na vida e constituir sai historia damos o nome de liberdade. Evidentemente a liberdade é algo que não se exerce no vazio, mas dentro das limitações impostas pelas circunstancias. Pois, como escreveu Karl Marx, “os homens fazem suas própria historia, mas não a fazem como querem; não a fazem sob circunstancias de sua escolha e sim sob aquelas com que se defrontam diretamente, legadas e transmitidas pelo passado”.

A liberdade e a consciência estão o intimamente relacionadas. Isso porque só tem sentido julgar moralmente a ação de uma pessoa se esta ação foi praticada em liberdade. Quando não se tem escolha (liberdade), é impossível decidir entre o bem e o mal (consciência moral).

Entretanto, quando estamos livres para escolher entre esta ou aquela ação, tornamo-nos responsáveis pelo que praticamos. É esta responsabilidade que pode ser julgada pela consciência moral do próprio indivíduo ou do grupo social.

Para melhor compreender esta síntese, veremos mais a fundo a liberdade, os valores e o homem propriamente dizendo sobre sua consciência diante destes conteúdos.

O que é valor?

Há, mundo das coisas e o mundo dos valores. Mas não podemos dizer que os valores são da mesma maneira que as coisas são. Isto é, não existe o valor em si enquanto coisa, mas o valor é sempre uma relação entre o sujeito que valora e o objeto valorado.

Isso significa que os valores existem na ordem da afetividade, ou seja, não ficamos indiferentes diante de alguma coisa ou pessoa, pois somos sempre afetados por elas de alguma forma. Reclamamos da caneta que não escreve bem, ouvimos várias vezes com prazer à música de nossa preferência, recriminamos que usa de violência e assim por diante.

Valorizar é uma experiência fundamentalmente humana que se encontra no centro de toda escolha de vida. Fazer um plano de ação nada mais é do que dar prioridade a certos valores, ou seja, escolher o que é melhor (seja do ponto de vista moral, utilitário etc.) e evitar o que é prejudicial para se atingir os fins propostos.

A conseqüência de qualquer valoração é, sem duvida, dar regras para a ação prática. Assim, se o ar é um valor para o ser vivo, é preciso evitar que a poluição atmosférica prejudique a qualidade desse bem indispensável. Se a credibilidade é um valor, não posso estar o tempo todo mentindo, caso contrário às relações humanas ficariam prejudicadas.

Portanto, diante daquilo que é , a experiência dos valores orienta para o que deve ser.
Neste capítulo, dentre os mais diversos valores possíveis, escolhemos analisar os valores morais. Moral é o conjunto de regras de conduta consideradas válidas para um grupo ou para uma pessoa. Veremos, a seguir, qual é a origem desses valores e o que caracteriza o ato propriamente moral.

De onde vêm os valores?

Se os valores não são coisas, pois resultam da experiência vivida pelo homem ao se relacionar com o mundo e os outros homens, talvez pudéssemos concluir que tais experiências variam conforme o povo e a época. É o que parece nos sugerir a diversidade de costumes: para algumas tribos, é indispensável matar os velhos e as crianças que nascem com algum defeito, o que para nós pode parecer incrível crueldade. Na Idade Média era proibido dissecar cadáveres, e no entanto as instituições de justiça tinham o direito de torturar seres vivos. Nosso costume de comer bife escandaliza o hindu, para quem a vaca é animal sagrado.

Isso significa que os valores são em parte herdados da cultura. Aliás, a primeira compreensão que temos do mundo é fundada no solo dos valores da comunidade a que pertencemos.

Em tese, tais valores existem para que a sociedade subsista, mantenha a integridade e possa se desenvolver. Ou seja, a moral existe para se viver melhor. Talvez essa afirmação cause espanto, se considerarmos que as regras morais são concebidas como condição de repressão humana, sendo, assim, geradoras de infelicidade. Isso também é verdadeiro, mas só enquanto deformação da moral autêntica e em contexto diferente daquele que estamos considerando aqui.

O que nos interessa enfatizar, em grupos humanos precisam de regras para viver bem.
Por isso é possível entender como, em certas tribos, onde há escassez de alimentação, há o costume de matar crianças defeituosas e velhos incapazes de produzir, uma vez que se tornam peso prejudicial à sobrevivência do grupo.

Dito de outra forma, mesmo que varie o conteúdo das regras morais, conforme a época ou lugar, todas as comunidades têm a necessidade formal de regras morais. É formalmente correto que a coragem é melhor que a covardia, que a amizade é um valor desejável entre os membros de um grupo.

No entanto, a coragem é um valor formal cujo conteúdo varia. Tomemos um exemplo corriqueiro, ainda que não referente à moral propriamente dita: se alguns riem do caipira com medo de atravessar a avenida na grande cidade, certamente será ele que rirá do citadino assustado com sapos e cobras na fazenda. Transportando o exemplo para o campo da moral, a coragem do guerreiro da tribo é certamente diferente da coragem do homem urbano desafiado, por exemplo pêlos riscos da corrupção.

Se amizade é um valor universal, a sua expressão varia conforme os costumes. Na sociedade patriarcal, em que a mulher se encontra confinada ao lar e subordinada ao homem, é impensável que ela tenha amigos do sexo masculino fora do círculo de amizades do seu próprio marido ou distante do seu olhar benevolente. Isso muda nos núcleos urbanos, após a liberação da mulher para o trabalho fora do lar.

Social e pessoal

Voltemos à objeção ensaiada alguns parágrafos atrás; nem sempre as regras morais visam ao bem da comunidade enquanto um todo. Sendo inúmeros os exemplos, vamos selecionar apenas alguns deles.

Por mais estável que seja a sociedade, sempre há mudança das relações entre as pessoas e grupos, na luta das relações entre as pessoas e grupos, Então, certas regras valem em determinadas circunstancias e deixam de valer quando ocorrem alternações nas relações humanas.

No entanto, existe a tendência de se resistir às mudanças, e, quando as regras permanecem mudanças inflexíveis, sedimentadas, acabam sendo esvaziadas de seu conteúdo vital e ficam caducas e sem sentido. A sociedade passa, então, por um momento de crise moral para cuja superação são exigidas inventividade e coragem, a fim de ser recriada uma moral verdadeiramente dinâmica e comprometida com a vida.

A experiência efetiva da vida moral supõe, portanto o confronto continuo entre a moral constituinte, representada pela critica aos valores ultrapassados, o esforço do constituição da vida moral exige a discussão constante dos valores vigentes, a fim de verificar em que medida sua realização se faz da vida ou da alienação.

O sujeito moral

Seriam então os valores, além de relativos ao lugar e ao tempo também subjetivos isto é dependentes das avaliações de cada indivíduo?

Se cada um pudesse fazer o que bem entendesse, não haveria moral propriamente dita. O sujeito moral tem a intuição dos valores como resultado da intersubjetividade, ou seja, da relação com os outros.

Ninguém nasce moral, mas torna-se moral. Há uma longa caminhada a sei percorrida para a aprendizagem de descentralização do eu subjetivo, a fim de superar o egocentrismo infantil e tornar-se capaz de “conviver”.

O homem virtuoso

Quando nos referimos ao homem virtuoso, à imagem que nos vem é de alguém amável, dócil, cordato, capaz de renuncia e pronto para servir aos outros. Trata-se de uma representação inadequada e muitas vezes perigosa.

Nietzsche referia-se à moral se escravos , como sendo aquela em que as falsas virtudes se fundam na fraqueza no servilismo, na renuncia do amor de si e portanto, na negação dos valores vitais.

A palavra virtude vem do latim vir, que designa “ o homem”, o “varão” (daí o objetivo viril). Virtus é o poder “força”, “capacidade”. O termo grego arrete significa qualidade da excelência, mérito. Portanto o homem virtuoso nada tem de frágil; ao contrário, virtude é a capacidade de ação, é a potência. Para Kant, a virtude é a força de resolução que revela o homem na realização do seu dever.

A virtude, enquanto disposição para querer o bem, supõe a coragem de assumir os valores escolhidos e enfrentar os obstáculos que dificultam a ação.

Por isso a noção de virtude não se restringe a apenas um ato moral, mas consiste na repetição e continuidade do agir moral. Aristóteles já afirmava que uma andorinha só não faz verão para dizer que a virtude não se resume no ato ocasional e fortuito, mas precisa tornar-se um hábito.

Obrigação e liberdade

No breve percurso que fizemos até aqui, percebermos que o ato moral é complexo e supõe contradições insolúveis entre social e pessoal, tradição e inovação e assim por diante. Não há como optar por apenas um lado da questão, mas é preciso admitir que tais contradições constituem o próprio “tecido” da moral. Continuando na mesma linha, não deixa de nos causar perplexidade o fato de que o ato moral exige obrigação e liberdade.

Se a construção de ciência moral se realiza a partir da aprendizagem da convivência entre os homens é preciso admitir que o ato moral é um ato de vontade. Como tal, distingue-se do desejo, já que é involuntário, surge com maior ou menor força e traz a exigência de realização.

Por isso, todo ato moral esta sujeito à sanção ou seja merece aprovação ou desaprovação elogio ou censura. O senso moral reage porque nossa afetividade foi atingida: certos atos considerados imorais, como por exemplo o assassinato de uma criança provocam-nos indignação.

Processo moral

Nem sempre a mudança moral equivale a processo moral. Existe processo quando se dá um avanço com melhoria de qualidade. Isso significa que certos valores antigos não precisam ser considerados necessariamente ultrapassados, da mesma forma que valores dos novos tempos algumas vezes podem não indicar progresso.
Quais seriam então os critérios para avaliar o progresso moral? Examinemos alguns deles.

• Ampliação da esfera moral: certos atos cujo cumprimento antes era garantido pela força legal (direito) por constrangimento social (costumes) ou por imposição religiosa, passaram a ser cumpridos por exclusiva obrigação moral. Por exemplo, um pai divorciado não precisaria da lei para reconhecer a obrigação de continuar sustentando seus filhos menores de idade. Por outro lado, certas situações em que as pessoas fazem o bem tendo em vista a re3compensa divina são indicadores de diminuição de esfera moral, porque nesse caso, o estímulo para a ação não é a obrigação moral, macertata “barganha” visando recompensa.

• Caráter consciente e livre da ação: a responsabilidade moral esta na exigência de um compromisso livremente assumido. Responsável é a pessoa que reconhece seus atos como resultantes da vontade e responde pelas conseqüências deles. Quando adultos, como mulheres e escravos, permanecem tutelados, o resultados é o empobrecimento moral das relações humanas.

• Grau de articulação entre interesses coletivos e pessoais: enquanto nas tribos primitivas o coletivo predomina sobre o pessoal, nas sociedades contemporâneas o individualismo exacerbado tende a desconsiderar os interesses da coletividade. É importante que o desenvolvimento de cada um não seja feito à revelia do desenvolvimento dos demais.

Mas os problemas decorrentes da decadência ética que presenciamos não podem ser resolvidos a partir de tentativas isoladas de educação moral do indivíduo. É preciso que exista vontade de política de alterar as condições patogênicas, isto é, as condições geradoras da doença social, para que se possa dar possibilidade de superação da pobreza moral.

Dito de outra forma, não basta “reformar o indivíduo para reformar a sociedade”. Um projeto moral desligado do projeto político está destinado ao fracasso. Os dois processos devem formar o homem plenamente moral só é possível na sociedade que também se esforça para ser justa.

A liberdade

Transpondo tais considerações do campo da ciência da natureza para o nível humano, não há como negar que também o homem se acha preso a determinismo: tem um corpo sujeito às leis da Física e da Química, é um ser vivo que pode ser compreendido pela biologia. Por isso, já no século XVIII, os materialistas franceses D’Holbacj e La Mettrie reduziam os atos humanos a elos de uma cadeia causal universal.

Temos de admitir inclusive a existência de determinados psicológicos na atividade psíquica normal e cotidiana, pela qual o homem entra em contato com o mundo para conhecê-lo e reagir afetivamente a ele. Por exemplo, se nos preocupamos com métodos de ensino, é preciso antes compreender os mecanismos de inteligência humana, tais como, memória, invenção, instituição, abstração e assim por diante.

Por isso, a aprendizagem da aritmética era tão penosa antigamente: desconhecendo-se que o pensamento infantil ainda é concreto, exigia-se a criança o uso do raciocínio abstrato, cujo desenvolvimento só acontece a partir da adolescência.

Watson e Skinner, psicólogos contemporâneos pertencentes à corrente comportamentista, consideram que o homem tem a ilusão de que é livre, quando na verdade apenas desconhece as causas que agem sobre ele. Com o desenvolvimento da ciência do comportamento seria possível conhecer de tal forma as modificações que daria para prever e portanto planejar o comportamento humano.

Aliás, é esse o tema de um romance de Skinner, Walden II, onde uma equipe de cientistas do comportamento dirige um cidade utópica.

Além de todos esses aspectos determinados, podemos acrescentar os determinados culturais: ao nascer, o homem se encontra em um mundo já constituído, recebendo como herança a moral, a religião, a organização social e política, a língua, enfim os costumes que não escolheu e que de certa forma determinam sua maneira de sentir e pensar.

As condições da liberdade

Para os deterministas, tudo tem uma causa, inclusiva a ação humana. Podemos até conhecer tais causas, mas elas existem. Levar essas conclusões até as últimas conseqüências é admitir que o homem não é livre.
Afinal, o homem é livre ou é determinado?

Não há como negar os determinismo que agem sobre o homem, já que ele se encontra situado no tempo e no espaço, tendo recebido uma herança cultural específica. Mas o homem não apenas essa situação dada, é também a consciência do determinados.

Isso significa que, ao tomar conhecimento das causas que agem sobre ele, é capaz de realizar uma ação transformadora, a partir de um projeto de ação. Deixa de ser passivo e passa a ser atuante. Se um primeiro momento a criança é levada pela predominância do desejo, ao mesmo tempo que é constrangidas pelas normas quer lhe são exteriores, a educação consiste no esforço de superação de tal estádio.

O universo infantil é marcado pela heterônoma, em que as ações são0 comandadas “de fora”, pêlos valores herdados dos pais e da sociedade em que ela vive. Quando a educação é boa, a criança deve caminhar em direção a autonomia, à deliberação, à capacidade de organização autônoma das regras. Bem sabemos que nem sempre é isso que ocorre de fato...

Liberdades

Quando nos referimos à liberdade de maneira geral, é preciso admitir que são vários os enfoques pelos quais podemos compreendê-la. Se ninguém é solitário, pois convive na sociedade dos homens, a liberdade é um desafio que permeia todos os campos da atividade humana.

Assim, podemos falar em liberdade ética quando nos referimos ao sujeito moral, capaz de decidir com autonomia a respeito de como deve se conduzir em relação a si mesmo a aos outros. Kant dizia que a liberdade consiste na obediência às leis que o próprio moral se impõe.

A liberdade econômica não deve ser confundida com a liberdade absoluta nos negócios. Por outro lado, porque toda atividade produzida supõe relações de dependência entre as pessoas e, por outro, porque convém precaver-se contra as aparências da liberdade. A livre iniciativa, fundada na idéia de que deve vencer o melhor”, muitas vezes nos faz esquecer de que em uma competição esportiva, por exemplo, os concorrentes sempre a iniciam em pé de igualdade: mesmo quando os talentos são diferentes, todos começam juntos na linha de partida.

A liberdade jurídica é uma das conquistas das modernas sociedades democráticas que defendem a igualdade perante a lei. Ninguém pode ser submetido à servidão e a escravidão; qualquer um tem ( ou deveria ter...) a garantia de liberdade de locomoção e ação, nos limites estabelecidos pela lei.

A aristocracia supõe a existência de indivíduos especiais que teriam privilégios. Foi contra as vantagens da nobreza que a burguesia se insurgiu no século XVIII, implantando os idéias contidos na Declaração dos Direitos que surgiram de inspiração para a construção da nova ordem daí em diante.

No entanto, nem todos têm acesso à lei de igual maneira. A justiça é lenta e cara e o poder econômico interfere sempre que pode. Ao se fazer as leis de um país, é quase impossível evitar a interferência daqueles que detêm algum poder e desejam manter privilégios.

Por ocasião da constituinte de 1988, a discussão a respeito de mais diversos assuntos, como reforma agrária, aposentadoria e verbas para educação pública, foi alvo de pressões das mais diversas, não podendo ser subestimadas as forças decorrentes do poder econômico.

Podemos concluir que a liberdade não é alguma coisa que é dada, mas resulta de um projeto de ação. É uma árdua tarefa cujos desafios nem sempre são suportados pelo homem, daí resultando os riscos de perda da liberdade. Como vimos, os descaminhos da liberdade surgem quando ela é sufocada a revelia do sujeito - no caso da escravidão, da prisão injusta, da exploração do trabalho, do governo autoritário - ou quando o próprio homem e ela abdica, seja por comodismo, medo ou insegurança.

Concepções éticas

Agir de acordo com o bem

Podemos dizer que a reflexão ética se inicia no mundo ocidental Na Grécia antiga, no século V a.C., quando se acentua o desligamento da compreensão de mundo baseada nos relatos místicos. Os sofistas rejeitam o fundamento religioso da moral e consideram que os princípios morais resultam das convenções sociais. Por essa época destaca-se o esforço de Sócrates no sentido de se contrapor á posição dos sofistas buscando os fundamentos da moral não nas convenções mas na própria natureza humana.

Seu discípulo Platão, no dialogo chamado Eutíforn, mostra Sócrates discutindo inicialmente sobre as ações o homem ímpio ou santo conforme a ordem constituída para então se perguntar em que consiste a impiedade e a santidade em si, independentemente dos casos concretos.

Para os hedonistas o bem se encontra no prazer. Em um sentido bem genérico, podemos dizer que a civilização contemporânea é hedonista quando identifica a felicidade com a aquisição de bens de consumo: ter uma casa, carro, boas roupas, boa comida, múltiplas experiências sexuais.

E, também, na incapacidade de tolerar qualquer desconforto, seja uma simples dor de cabeça, seja o enfrentamento sereno das doenças e da morte.

No entanto, o principal representante do hedonismo grego, no século III a.C., Epicuro, considera que os prazeres os corpo são causadas de ansiedade e sofrimento, e, para a alma permaneça imperturbável, é preciso, portanto, desfazer os prazeres materiais.

Essa atitude o leva a privilegiar os prazeres espirituais, dentre ao quais destaca aqueles referentes á amizade. Varias têm sido as soluções encontradas para as questões éticas no decorrer da história da filosofia, mas desde a expansão do cristianismo a cultura ocidental ficou marcada pela tradição moral cujo fundamento se encontra nos valores religiosos e na cresça na vida depois da morte, Nessa perspectiva, os valores são considerados transcendentes, porque resultam de doação divina, o que costuma levar à identificação do homem moral com o homem temente a Deus.

No entanto, a partir da Idade Média Moderna, culminando no movimento da ilustração no século XVIII, a moral se torna laica. Portanto, ser moral e ser religioso deixam de ser inseparáveis, tornando-se perfeitamente possível admitir que um homem ateu seja moral, e, mais ainda, que o fundamento dos valores não se encontra em Deus, mas no próprio homem.

A moral iluminista

O século XVIII é conhecido como o século das Luzes, porque em todas as expressões do pensamento e atividade do homem, a razão, como a luz, se torna o instrumento para intervir e reorganizar o mundo. Recorrer à razão supõe a recusa da intolerância religiosa, a rejeição do critério de autoridade.

Para Kant, maior expoente do iluminismo, a ação moral é autônoma, pois o homem é o único ser capaz de se determinar segundo leis que a própria razão estabelece.

Portanto a moral iluminista é racional, laica, acentua o caráter pessoal da liberdade do indivíduo e o seu direito de contestação. Também é uma moral universalista, porque, embora admitia as diferenças dos costumes dos povos, aspira por encontrar o núcleo comum de valores universais.

Em busca do homem concreto

A partir do século e no decorrer do século XX, os filósofos começam a se posicionar contra a moral formalista kantiana findada na razão universal, abstrata, e tentam encontrar o homem concreto da ação moral.

É nesse sentido que podemos compreender o esforço de pensadores tão diferentes como Nietzsche, Marx, Kierkegaard, Freud e os existencialistas. Dentre estes, vamos destacar brevemente a importante contribuição de Nietzsche.

A moral cristã é a moral do rebanho geradora de sentimentos de culpa e ressentimentos, e fundada na aceitação do sofrimento, da renuncia, do altruísmo, da piedade, típicos da moral dos fracos.

A questão que se coloca hoje é a da superação dos empecilhos que dificultam a existência de uma vida moral autêntica.

Ainda mais: o esforço de recuperarmos da ética passa pela necessidade de não se esquecer da dimensão planetária da sociedade contemporânea, quando todos os pontos da terra, essa aldeia global, se acham ligados pelos meios de comunicação de massa e pelos mais velozes transportes.

Isso nos faz considerar a moral além dos limites restritos dos pequenos grupos, como a família, o bairro, a cidade, a pátria. A generosidade da moral planetária supõe a garantia da pluralidade dos estilos de vida, a aceitação das diferenças, sem que se sucumba à tentação de dominar o outro por considerar a diferença um sinal de inferioridade.

A amizade

A adolescência é o momento em que os amigos assumem papel primordial, que grupos se formaram, que descobrimos, poucos a pouco, nossa identidade. Em função disso, trataremos aqui da amizade, embora a abordagem seja mais psicológica que propriamente filosófica.

Características da amizade

A amizade é uma relação de amor, de afeto, de tipo muito especial. Ela se desenvolve no tempo, a partir de encontros sucessivos que nos revelam novas perspectivas, novos caminhos, fazendo-nos compreender uma parte de nós mesmos e do mundo que nos rodeia. É um momento de autenticidade frente à diversidade do outro.

A amizade não envolve sofrimento. Os amigos sentem-se bem na companhia um do outro, sem ambivalência. Não há lugar para mesquinharias, maledicências nem mal-entendidos. Cada um ajuda o outro a descobrir, por si mesmo, aquilo que é essencial em sua vida, percorrendo juntos uma parte do caminho.

A amizade é um sentimento recíproco. Não é possível ser amigo. A amizade é uma relação descontínua. Podemos passar muito tempo sem ver um amigo, mas, quando vemos, é uma alegria, um reencontro sem cobranças pelo tempo que passou. Podemos retomar as conversas, sem obstáculos, sem mal-estar, sem maiores explicações.

A amizade, também, não é exclusivista, ou seja, podemos ter vários amigos, sem que um roube nada do que damos ao outro. Não há concorrência entre amigos. Há reconhecimento do valor da individualidade única e inconfundível de cada um. Toda individualidade merece esse reconhecimento.

Na adolescência , entretanto, às vezes, a amizade é possessiva. Temos ciúmes do amigo que dá atenção a outra pessoa. Sentimo-nos roubados do tempo e do afeto que ele dedica a outra.

É o momento de parar e rever essa amizade. Nosso ciúme é fruto do sentimento de posse, que está ligado ao nosso próprio bem e a nossa insegurança, ou é resultado do descaso do outro que já não valoriza a nossa relação e a nossa individualidade como anteriormente? No primeiro caso, somos nós que não correspondemos á amizade e desejamos amputar as possibilidades de descoberta, de afeto, de encontro do outro.

No segundo caso, é o outro que não se comporta como amigo, que se desinteressa da relação e que nos desilude com a falta de reciprocidade. Seja por uma razão ou por outra, a amizade está em crise e é necessário discuti-la, resolver os mal-entendidos para que um novo encontro seja possível, ou que os caminhos se separem.
Talvez não seja muito fácil encontrar verdadeiros amigos. Mas, quando os temos, vale a pena cultivar sua amizade, que pode vir a durar a vida inteira.

O amor e a paixão

Por que falar do amor? Não basta amar?
A resposta é não. Em qualquer idade, o amor, A paixão entre duas pessoas é algo maravilhoso, mas quanto mais conhecemos a estrutura desses sentimentos e das emoções que lhes são relacionadas, melhor poderemos vivê-las, tanto na adolescência quanto em outros momentos da vida.

Estamos, portanto, escolhendo uma das paixões “alegres”, discutidas no texto sobre o desejo, uma vez que enfocaremos somente a paixão amorosa e, ainda aqui, do ponto de vista psicológico.
Francesco Alberoni, sociólogo, italiano contemporâneo, estabelece algumas diferenças entre a paixão e o amor, como veremos a seguir.

A paixão

A paixão, segundo Alberoni, é uma revelação, uma fulguração que transforma toda nossa vida. É o advento do extraordinário que nos retira da tranqüilidade da vida cotidiana, na qual os laços afetivos se encontram já consolidados, e nos atira num rodamoinho que transfigura a qualidade da vida e da experiência, levando-nos a alterar radical e profundamente nossas relações com os outros e nossa postura frente ao mundo.

A paixão, ainda de acordo com a terminologia de Alberoni, é um “estado nascente” que pode levar uma pessoa a descobrir outra ou a descobrir ideais coletivos que a façam ligar-se a um grupo ou movimento. Assim, a paixão é um impulso vital que nos leva a explorar todos os possíveis de nossa vida, que nos faz descobrir emoções intensas e ativas nossa imaginação, tornando-nos mais criativos e contribuindo para que assumamos riscos.

A paixão é ainda, exclusivista. Seu objeto é um só e não pode ser substituído. A paixão exige total dedicação. No entanto, pode ser unilateral, isto é, pode não ser correspondida.

A paixão cria, também, o tempo e o espaço místicos. Determinadas datas, determinados lugares são considerados “sagrados” pelo par enamorado. São “seus”. Estão ligados à origem da paixão e são comemorados seguidamente, tendo a função de reativar os sentimentos.

O amor

Às vezes, em continuação à paixão, outras, nascendo sem ela, temos o amor. O amor é um sentimento de tranqüilidade, de ternura, de reconhecimento das boas qualidades do outro e de aceitação de seus defeitos. Dura mais que a paixão porque se encaixa e se desenvolve fora das situações extraordinárias, dentro dos limites da vida cotidiana.

A passagem da paixão para o amor é feita através de provas, algumas cruciais, às quais nos submetemos e submetemos a outro. Se as provas forem superadas, a paixão vai se revestindo de certeza e o amor passa a preencher os espaços da vida cotidiana, durante a qual nos preocupamos com o outro, assumimos certas tarefas p0ara o seu bem-estar, dedicamo-nos à realização de projetos comuns.

A prova à qual nos submetemos é a prova da verdade: queremos saber se estamos mesmo apaixonados, ou se podemos nos distanciar e dar a paixão por encerrada. É a própria força dos nossos sentimentos que nos impele a resistir, a crer que nos enganamos, que estaremos bem sem o outro. Já nos inebriamos, agora queremos paz. Basta, entretanto, pouco tempo de separação para que sintamos o renascer da paixão, do encantamento, da necessidade e do desejo de estar com o outro. Neste caso, a prova foi superada.

Devemos sempre nos lembrar de que o amor é uma relação que precisa ser cuidada para não cair no ressentimento, na cobrança por todas as renúncias feitas. É um contínuo refazer de projetos que se adaptem a cada mudança de curso de qualquer um dos parceiros e a cada época da vida a dois, pois o equilíbrio entre a individualidade de cada um, sua necessidade de realização e as exigência do projeto comum é extremamente frágil.
Fonte: Brasil Escola

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