Animais Fantásticos #7: O fofo, mas mortal Lóris Lento (Snow Lóris)

O traçado no rosto do slow lóris da ilha de Java chama atenção para a parte mais perigosa—a boca.
Foto de Joël Sartore, National Geographic Photo Ark


Com os olhos de ursinho de pelúcia, focinho que lembra um botão e rosto que parece ter vindo do cruzamento de um panda-vermelho com um bicho-preguiça, o slow lóris da ilha de Java pode muito bem ser uma das criaturas mais fofas do planeta Terra. Mas o que parece ser bonitinho para nós, outros animais podem interpretar como um sinal de perigo.

Nycticebus é um gênero de primata da família Lorisidae, pertencente a infraordem lêmure (Lemuriformes), também conhecido como "Slow Loris" ou Lóris Lento em Português. É o único gênero de primatas venenosos e atualmente algumas especies correm o risco de entrar para a lista de animais em extinção, principalmente por conta do tráfico e venda ilegal. Pode ser encontrado no Subcontinente indiano, Sudeste asiático, China e no Arquipélago Malaio.

Trata-se de gênero constituído de varias espécies de primatas noturnos da subordem strepsirrhini. Encontrados no Sudoeste Asiático e áreas fronteiriças, seu habitat alcança desde Bangladesh e nordeste da Índia até o Arquipélago de Sulu nas Filipinas a leste, e da província de Yunnan na China ao norte até a ilha de Java ao sul. Existem ao menos oito espécies de slow loris validadas atualmente: o sunda slow loris (N. coucang), bengal slow loris (N. bengalensis), pigmeu slow loris (N. pygmaeus), slow loris de Java (N. javanicus), slow loris de Bornéu (N. menagensis), N. bancanus, N. borneanus, e N. kayan

 

Os lóris lentos de Javan são agora uma das seis espécies de mamíferos conhecidas por usar veneno contra indivíduos de sua própria espécie. (Aprisonsan via Wikimedia Commons sob CC BY-SA 4.0 International)


Os lóris são os únicos primatas venenosos do mundo. Esse bichinho minúsculo secreta toxinas na saliva e das glândulas na parte interna das patas dianteiras.

Quando as duas toxinas se misturam, ocorre um tipo de veneno duplo, diz Anna Nekaris, bióloga especializada em conservação da Universidade de Oxford Brookes, no Reino Unido.

O fato é que, embora a mordida dos lóris seja letal, eles são pequeninos e lentos. Isso significa que eles se beneficiariam se conseguissem demonstrar sua ameaça aos outros animais sem precisar entrar em um duelo trabalhoso.

Lóris macho adulto. Foto: Projeto Little Fireface.



“Muitos animais fazem isso,” diz Nekaris. “Eles usam a cor para sinalizar toda sua força e dominância.”

Cientistas chamam isso de coloração aposemática e ela se aplica a todas as espécies de animais, desde gambás e texugos a sapos flecha e joaninhas.

Em um estudo publicado em 2019 na revista científica Toxins, Nekaris e seus coautores usaram as provas reunidas ao longo de oito anos, provenientes de mais de 200 animais que foram capturados vivos e, depois, soltos para mostrar que os traços em forma de máscara no rosto do slow lóris de Java seguem os padrões da coloração aposemática. Ou seja, os padrões de traços chamam a atenção para as partes mais perigosas dos animais—suas bocas—e seriam altamente perceptíveis em meio a uma variedade de sistemas visuais, incluindo os pertencentes aos predadores conhecidos dos lóris, como por exemplo, águia-audaz australiana, pítons, lagartos-monitores e orangotangos.

As descobertas esclarecem para nós o que o resto do mundo animal aparentemente já sabe. O lóris é uma “linda, pequenina, minúscula e fofinha bola de pelo da morte,” diz Nekaris.
 

Pequenos terríveis

Vale notar que Nekaris e seus coautores também conseguiram provar outra suspeita—a de que lóris mais jovens são mais agressivos que os mais velhos.

Depois de estudar esses animais por 25 anos, Nekaris diz que sempre pareceu haver uma diferença entre as gerações. Adultos maduros (de dois anos ou mais) geralmente se acalmavam logo depois de serem capturados, conta ela. Porém, quando capturavam os jovens (entre um e dois anos de idade), era preciso ter cuidado.

“Os mais novos realmente tentam matar você,” afirma Nekaris. “Eles têm uma força incrível. Alguns deles gritam. E juntam saliva dentro da boca, que possui veneno.”

Às vezes, os animais lutam tanto que os cientistas nem conseguem terminar as medições— o que é impressionante para um animal que pesa tanto quanto um hamster.

Contudo, após documentar os níveis variáveis de agressão dos animais ao longo de oito anos, os cientistas comprovaram que eles apresentam essa fase mais violenta durante a juventude. Isso é o mais interessante de tudo porque o novo estudo também mostra que lóris jovens tendem a ter um contraste mais marcante em seus traços em forma de máscara.

Isso sugere que esses traços podem ter outra finalidade— comunicar-se com os outros lóris.

Os slow lóris de Java vivem em duplas formadas por um macho e uma fêmea e, juntos, vigiam um território de floresta do tamanho de um campo de futebol. Infelizmente, quase não resta mais habitat na ilha indonésia de Java devido à agricultura e ao desmatamento, então cada espaço disponível já tem dono. Um casal pode ficar no mesmo local por até oito anos. Isso significa que, quando os lóris jovens “deixam a casa dos pais”, precisam lutar por seu próprio território.

“Os animais mais jovens também são os que têm mais feridas,” afirma Nekaris. “Feridas horripilantes, fétidas e necróticas.”

Com tanta coisa em jogo no que diz respeito a ganhar esse território com tão pouca idade e mantê-lo até a vida adulta, Nekaris diz que a evolução parece estar privilegiando a enorme quantidade de energia gasta nesses sinais faciais para indicar a presença de veneno e valentia.

Um lóris lento e sua pose defensiva de veneno. Foto: Projeto Little Fireface.


 

“Um traço muito intrigante”

Ted Stankowich, um ecologista comportamental evolucionário da Universidade Estadual da Califórnia, em Long Beach, dedicou sua carreira ao estudo dos sinais aposemáticos em todos os seres vivos, desde gambás até pandas gigantes. Mas, em geral, os sinais que ele observa são utilizados estritamente como dispositivos antipredadores.

“Os lóris são realmente únicos, já que seu veneno não é útil apenas contra predadores, mas também contra seus coespecíficos, ou seja, outros lóris,” diz Stankowich. “Isso é um traço muito intrigante deste sinal.”

Embora Stankowich considere o estudo interessante e bem fundamentado, ele gostaria que os autores tivessem conseguido medir a toxicidade nos lóris para ver se eles também são mais venenosos durante a juventude, correspondendo à maior agressão e coloração contrastante.

Também é curioso o fato de o sinal se modificar à medida que os animais envelhecem, pois não vemos o mesmo em outros bichos com sinais aposemáticos clássicos. “Gambás nascem com as listras brancas que terão pelo resto de suas vidas e acredito que o mesmo vale para outros carnívoros,” diz ele.

É possível que os lóris jovens tenham mais motivos para sinalizar seu veneno e agressividade, seja porque são menores ou mais fáceis de serem capturados, seja porque ficam mais vulneráveis ao procurar por novos territórios.

“Raramente a evolução é algo simples,” diz Nekaris.


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Fonte: National Geographic Brasil

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