Em maio de 1817, no comando do
Forte de Cinco Pontas, no Recife, o coronel Pedro Pedroso aguardava a
chegada de um exército inimigo, que vinha da Bahia para botar abaixo a
república proclamada em Pernambuco, dois meses atrás. Porém, o general
Domingos Teotônio — então, à frente das tropas pernambucanas — decretou a
retirada do Recife e ele não chegou a entrar em combate.
Em setembro de 1824, a situação se repetiu: Pedroso estava novamente
pronto a lutar pelo Recife. Dessa vez, contudo, do lado oposto,
marchando na armada despachada do Rio de Janeiro pelo imperador Pedro I
contra mais um movimento libertário, lançado por antigos revolucionários
de 1817: a Confederação do Equador. Mas ele não se achava um traidor,
pois o seu projeto político era outro, acima e além da pendenga entre
monarquistas e republicanos…
O PARTEIRO
“Negro, em festa de branco, é o primeiro que apanha e o último que
come”. Nesse ditado popular se resumia toda a ideologia do “Pardo do
Recife”, como Pedro Pedroso apelidara a si mesmo. A causa pela qual
lutava era, em primeiro lugar, a sua gente, os pretos e mulatos
escravizados ou livres, mas sempre desvalidos. E, em segundo lugar, os
seus interesses pessoais, é claro, que ele também estava longe de ser
santo — um São Benedito, se fosse o caso; mas, seguramente, santidade
não era o seu forte.
Pobre, semiletrado, porém muito inteligente, enérgico e valente, ele
abriu caminho na vida à custa do próprio esforço. Alistou-se como praça
no regimento de Artilharia e chegou a capitão, o posto máximo que um
mulato brasileiro podia aspirar no exército português. Tornou-se
conhecido, respeitado, amado e temido no meio do povo. E, além de ser o
xodó das escurinhas, também arrancava suspiros de muitas brancas “de
família” que, por trás das gelosias, o viam passar pelas ruas, alto,
bonito, elegante, com suas longas costelas e fartos bigodes, sempre
montando cavalos magníficos.
No dia seis de março de 1817, Pedroso serviu de “parteiro” da
Revolução. Quando o capitão José de Barros Lima — o “Leão Coroado” —
recusou a ordem de prisão dada pelo brigadeiro português Manoel Barbosa e
o matou, foi ele que tirou a espada ensanguentada das mãos do camarada
para, empunhando-a, assumir o comando do Regimento de Artilharia do
Recife. E, em seguida, proclamou o início do levante, logo apoiado pelos
recifenses e depois por todo Pernambuco, pela Paraíba e pelo Rio Grande
do Norte. Além disso, foi ele que, naquele dia, sem titubear, mandou
fuzilar o coronel Tomás de Aquino, enviado pelo governador português
Caetano Pinto para parlamentar com os militares rebelados, assim
acabando com qualquer possibilidade de recuo do movimento.
DISCRIMINAÇÃO
Também foi Pedroso que, dias depois, já instalado o Governo
Provisório de Pernambuco, invadiu a sala onde os cinco governadores
estavam reunidos e ameaçou de morte um deles, o advogado José Luís
Mendonça. Assim, forçou Mendonça a retirar uma proposta de buscar acordo
com o príncipe D. João, que estava prestes a ser aprovada. Foi ele,
ainda, que, com muita luta, conseguiu arrancar daquele governo o
primeiro ato abolicionista já decretado no Brasil, concedendo alforria
aos escravos que se alistassem no exército. E foi ele que, pessoalmente,
treinou a primeira tropa de cativos assim libertos.
Finalmente, foi Pedroso que mais insistiu para que os inimigos da
Revolução fossem tratados com rigor. Para dar exemplo ele até mandou,
por conta própria, fuzilar três desertores da tropa em praça pública.
Mas os governadores não o escutaram — foram frouxos, em sua opinião —, o
movimento foi derrotado e o seu desencanto começou.
Com dezenas de outros patriotas, Pedroso foi preso e despachado para a
Bahia, e lá sentiu a discriminação doer ainda mais, porque partia dos
seus próprios companheiros. Os negros eram, de fato, os primeiros a
apanhar e os últimos a comer, e não apenas nas festas dos brancos, mas
até na cadeia, junto com eles!
Então ele perdeu o pouco respeito que ainda tinha pelos republicanos.
Estes seriam até piores que os outros brancos, porque iludiam os pretos
com falsas promessas. Ora, se eles praticassem a liberdade, a igualdade
e a fraternidade que pregavam, a escravidão não teria cessado nos
Estados Unidos quando aquele país ficou independente, em 1776? E por que
ela não fora extinta nas colônias francesas, após a Revolução de 1789?
Certos, para ele, estavam os negros do Haiti que, em 1804, mataram ou
expulsaram todos os “caiados” daquela ilha!
Pela República em 1817 e contra ela em 1824
Após a anistia de 1821, mais segregação. Pedroso não foi libertado
com os outros e sim enviado para Portugal, acusado de mandar matar o
coronel Aquino. Mas foi perdoado e voltou para sua terra. E aqui estava,
em fevereiro de 1822, quando foi procurado por Antônio de Menezes
Drummond, agente do ministro José Bonifácio, que andava às turras com
Gervásio Pires, então presidente de Pernambuco. Na época, Bonifácio
defendia que o Brasil proclamasse a independência de Portugal e se
tornasse um império, regido pelo príncipe D. Pedro. Mas Gervásio temia
que, indo por esse caminho, o resto do país continuasse sendo oprimido e
explorado pela corte do Rio de Janeiro, e vacilava em apoiar essa
proposta.
Drummond não teve dificuldade em ganhar Pedroso para a sua causa com
promessas de melhorias de vida para o povo e aumento de soldo para os
militares. Então, com o prestígio popular que tinha, o Pardo agitou as
tropas e as massas. E, em setembro, derrubou o governo de Gervásio,
sendo premiado com o comando das tropas de Pernambuco.
Mas o novo governo, a “Junta dos Matutos”, formado por senhores de
terras e escravos, também não nutria grande simpatia pelas causas
abolicionistas e populares. E o Pardo, achando que as circunstâncias lhe
eram favoráveis, resolveu dar um passo à frente. Ele sublevou o 3º e 4º
regimentos, os “Bravos da Pátria” e os “Montabrechas”, formados por
negros e mulatos, respectivamente, e no dia 21 de fevereiro de 1823 o
Recife foi tomado pela malta de pele escura, dando vivas ao Haiti e
recitando uma quadrinha que anunciava o fim de todos “marinheiros”
(portugueses) e “caiados” (brancos) no Brasil.
A “Pedrosada”, porém, foi abafada, e Pedroso despachado para o Rio de
Janeiro. E lá estava preso quando os pernambucanos rebelaram-se mais
uma vez, em 1824, na Confederação do Equador. Então, sabendo da
liderança que ele exercia sobre o povo pobre daquela província, D. Pedro
I lhe ofereceu anistia e o comando das tropas de volta, em troca do seu
apoio. E o Pardo do Recife aceitou participar de mais uma “festa de
brancos”, ainda com a esperança de que um dia, no Brasil, os pretos e
mulatos fossem os últimos a apanhar e os primeiros a comer. E nessa
expectativa viveu até morrer de velhice, no Rio de Janeiro.
Fonte: Blog Diário de Pernambuco
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