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Forte de São Jorge (chamado de St. George ou Castelo de Terra pelos holandeses)
Gravura de Joan Bleau, 1630. |
O Forte [ou
Castelo] de São Jorge localizava-se no Istmo de Olinda e Recife entre o
limite norte do povoado do Recife e a cidade de Olinda. Foi um dos
bastiões da resistência contra os invasores holandeses em 1630.
A estrutura denominada de Forte de São Jorge remonta a uma trincheira
portuguesa conquistada pelo corsário inglês James Lancaster e retomada
um mês mais tarde, em Maio de 1595. Ante ao fracasso dos holandeses na
Bahia e da provável segunda tentativa de invasão, ao mesmo tempo em que
as defesas do Recife eram precárias, Matias de
Albuquerque, Superintendente da Guerra da Capitania de
Pernambuco, reconstruiu a antiga trincheira "com mais solidez" e
transformou-a em forte. Neste mesmo período mandou construir uma nova
fortaleza, obra financiada e executada por Diogo Pais, localizado a
poucos metros ao norte do Forte de São Jorge.
Entretanto, não houve tempo para o término da empreitada. Em 15
de fevereiro de 1630, o novo forte ainda estava a "alguns pés acima do
solo" quando a poderosa armada da Companhia das Índias Ocidentais (WIC),
sob o comando do Almirante
Hendrik Cornelissen Lonck, surtiu sobre a costa pernambucana.
De acordo com as fontes flamengas, durante a invasão em 02 de Março de
1630, o Forte de São Jorge, construído em alvenaria de pedra de
cantaria, e o Forte de São Francisco da Barra, que havia sido construído
nos arrecifes e lhe era fronteiro, abriram fogo contra os navios,
impedindo a aproximação da esquadra. Também não conseguiam entrar no
porto pois Matias de Albuquerque afundara oito barcos na entrada da
barra, impedindo a passagem.
A gravura a seguir de 1630 retrata o ataque holandês: 1. Forte de São
Jorge (identificado por S. George); 2. Forte de São Francisco da Barra
(identificado como Hetzee Fort), em fogo cruzado com o primeiro; 3. O
povoado do Recife.
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Die stat Olinda de Phernambuco welche durch die Hollender im Februari. Amsterdam, Erobert Worden, 1630 |
O Forte de São Jorge, comandado pelo capitão Antônio de Lima, resistiu
heroicamente ao desembarque holandês, sendo bombardeado pelos navios
durante mais de 20 dias. Além disso, 3.000 homens desembarcaram ao norte
de Olinda, nas praias do Pau Amarelo. Waerdenburg, o coronel que os
comandava, avançou pelo norte e cercou o Forte de São Jorge, iniciando o
bombardeio. A gravura acima também retrata esta ação.
Em outra gravura holandesa, abaixo, podemos ver bem nítido: 1. O Forte
de São Jorge (identificado como S. George); 2. As obras portuguesas
iniciadas do forte de Diogo Pais (que viria a se tornar o Forte do
Brum); 3. Forte de São Francisco da Barra; 4. Povoado do Recife.
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De Stadt Olinda de Pharnambuco. Estampa e folheto holandeses, do Maritiem Museum, Rotterdam. 1630 |
Com as muralhas arrasadas pela artilharia inimiga, uma quantidade
numerosa de combatentes mortos, restando apenas 6 em condições de lutar,
o seu comandante, o Capitão Antônio de Lima, capitulou na manhã do dia 2
de Março, tendo erguido a bandeira branca. Waerdenburgh ficou
impressionado com o que viu, pois em função da qualidade da defesa e da
coragem dos combatentes pernambucanos ele suspeitava que no Forte havia
uma tropa mais numerosa, razão pela qual fez uma menção honrosa ao
Capitão.
O francês MOREAU, assim descreve a conquista:
"[...] Cientes da tomada de Olinda, os ricos comerciantes de Amsterdã
despacharam logo outros navios que, mal chegaram, se juntaram às
primeiras tropas e foram atacar um forte de pedra distanciado da cidade
de Olinda uns três quartos de légua, situado sobre um dique [o istmo de
areia que liga Recife a Olinda], de uma légua de comprimento e
quinhentos passos de largura, entre a terra firme e uma rocha comprida e
larga [o recife de pedra] que borda toda a costa do Brasil, a um tiro
de mosquete em direção ao mar."
Uma vez ocupado, o Forte de São Jorge foi rebatizado pelos invasores de Fort St. George ou
Landt Casteel (Castelo de Terra), assim como o Forte de São Francisco da Barra passou a ser chamado de
Water Casteel (Castelo
do Mar), posteriormente chamado de Forte do Picão (este resistiu até
1910, quando foi destruído na reforma do Porto do Recife). Além disso, o
comandante Waerdemburch, deu continuidade à construção do novo forte
utilizando-se dos alicerces do Forte Diogo Pais, que recebeu o nome de
Forte do Brum.
Estes fortes figuram em inúmeros mapas e gravuras, num rico legado
cartográfico do período holandês e posterior. Como são muitos,
apresentamos neste post apenas dois deles, fornecendo assim uma boa
noção da localização e disposição do Forte de São Jorge e dos demais que
faziam a primeira linha de defesa do porto.
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Manuscrito do Algemeen Rijksarchief, Haia |
O trabalho acima foi elaborado de modo esquemático, quando os holandeses
apenas começavam a controlar a situação no Recife (1631-1635). Vê-se a
bandeira dos flamengos hasteadas nos fortes de São Jorge (1) e de São
Francisco da Barra (2). Também já podemos notar o forte do Brum (3) e de
Madame Bruyne (4).
Quando Maurício de Nassau chegou ao Recife, em 1637, tratou de reforçar ainda mais o sistema de defesa de toda a área.
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"CARTE VANDE HAVEN VAN PHARNAMBOCQVE... Anno 1639”
Manuscrito do Atlas de J. Vingboons, Instituto Arqueológico, Histórico e Geográfico Pernambucano, Recife 1639 |
Neste outro mapa, elaborado poucos anos após o anterior, podemos notar
as mesmas fortificações (mantivemos a mesma numeração), sendo que o
Forte do Brum já se encontra bem mais evoluído.
Sobre o Forte de São Jorge, Maurício de Nassau, no seu "Breve Discurso"
de 14 de Janeiro de 1638, sob o tópico "Fortificações", reporta:
"Fora do Recife encontra-se primeiro o velho castelo denominado São
Jorge. Achando-se este castelo muito arruinado, os administradores do
hospital pediram-no para servir de enfermaria, com promessa de
repararem-no interiormente e conservarem-no à sua custa, utilizando-se
dele até que seja necessário ao serviço militar e à defesa do Recife, o
que resolvemos conceder-lhe para poupar despesas à Companhia, e porque
este castelo é atualmente inútil, e sê-lo-á talvez também para o futuro.
Contudo ficaram aí todas as peças."
O "Relatório sobre o estado das Capitanias conquistadas no Brasil", de
autoria de Adriaen van der Dussen, datado de 4 de Abril de 1640,
complementa:
"À distância de dois tiros de mosquete do Recife, em direção à cidade
de Olinda, pelo istmo, está o Castelo de São Jorge, feito de pedra,
tendo do lado da cidade de Olinda um baluarte e um meio-baluarte, de
construção elevada e no qual estão 13 peças de ferro, 1 de 12 libras, 1
de 9 lb, 6 de 6 lb, 3 de 5 lb, 1 de 4 lb, 1 de 3 lb; domina o istmo e a
barra."
Assim como BARLÉU transcreve a informação:
"(...) A dois tiros de mosquete do Recife, no caminho de Olinda,
mesmo na costa, surge, num cimo bastante alto, o Forte de São Jorge,
feito de pedra e resguardado por um bastião de mármore e assentando
treze bocas de fogo contra a entrada do porto."
Nesta belíssima obra a óleo retratada por Gilles Petters, que embora
tenha sido pintada em 1644 representa a situação de 1637, facilmente
percebido quando comparada com os inúmeros mapas do período, podemos
ver: 1. Forte de São Jorge; 2. Forte do Brum; 3. Forte Bruyne. Como
curiosidade vemos também uma balsa (4) que fazia a travessia entre a
vila do Recife e a ilha de Antônio Vaz, antes da construção da Ponte do
Recife.
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Gilles Petters, pintura a óleo representando Maurícia, o Recife, o Istmo e Olinda em primeiro plano - 1644 |
Durante a ocupação holandesa até 1645 o Forte de São Jorge, desgastado
após a sangrenta batalha de ocupação, passou a servir inicialmente de
enfermaria (hospital de campanha), embora tenha permanecido equipado com
algumas peças de artilharia. Com a construção do Forte de São João
Batista do Brum, mais moderno e adequado à tecnologia bélica da época, e
a do Forte Madame Bruyne, o Forte de São Jorge foi relegado ao
abandonado.
Após a reconquista de Pernambuco pelos luso-brasileiros e já bastante
deteriorado, teve parte de suas ruínas retiradas e utilizadas na
restauração e reforço do Forte do Brum em 1667/1668.
Abandonado e em ruínas, o governador Aires de Souza Castro doou o Forte
de São Jorge ao capitão-mor João do Rego Barros, mediante uma carta de
sesmaria datada de 31 de maio de 1679. Contudo, a carta fazia uma
ressalva importante: naquele local era para ser fundada uma igreja de
Nossa Senhora do Pilar, que foi erguida em 1680.
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Igreja do Pilar, construída sobre as ruínas do Forte de São Jorge - 2013 | |
Fonte: Bairro do Recife:Forte São Jorge, bastião da resistência contra a invasão holandesa